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Artigo: Nova Lei de Licitações - Serviços - Normas Específicas - Marcelo Palavéri

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A Lei 14.133/21 além de definir serviços de forma geral, apresenta outras categorias que serão estudadas a partir de agora. São elas: serviços comuns (e bens); serviços especiais (e bens); serviços contínuos (e fornecimentos); serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra; serviços não contínuos ou contratados por escopo; e serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual.

Serviço

A Lei 14.133/21 traz a definição genérica de serviço no artigo 6º, XI:

Art.6º …

XI – serviço: atividade ou conjunto de atividades destinadas a obter determinada utilidade, intelectual ou material, de interesse da Administração;

Serviços, no que se refere às licitações, são todas as atividades destinadas a obter utilidade de interesse para a administração, sempre prestadas por terceiros.

Acima, distinguimos serviço de obra.

Recordando, a diferença, a nosso ver, deve ficar no âmbito da preponderância. Por essa noção, estaríamos diante de uma obra quando preponderasse o resultado dela esperado, consistindo a obra na criação ou modificação de um bem corpóreo, tal como expresso no conceito legal (artigo 6º, XII).

Estaremos diante de serviço, por sua vez, quando preponderar a atividade humana, “destinada a obter determinada utilidade… de interesse da Administração” (art. 6º, XI).

Bens e Serviços Comuns

A conceituação de bens e serviços comuns encontra sentido para sabermos quais são os passíveis de serem submetidos à licitação na modalidade do pregão, que deve ser utilizado com exclusividade para selecionar os contratados desses objetos.

Por isso a definição do artigo 6º, XIII:

ART.6º…

XIII – bens e serviços comuns: aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade podem ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado;

Vê-se, do exposto, que é a natureza do objeto que define a possibilidade de adoção da modalidade pregão, como ademais, de todas as modalidades previstas pela nova lei.

Poder-se-á, assim, utilizar o pregão para a contratação de bens e serviços comuns, sendo estes definidos inicialmente pela Lei 10.520/02 como aqueles “cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado” (art. 1º, parágrafo único).

A definição legal foi agora reproduzida pela Lei 14.133/21.

A nosso ver, longe de auxiliar na conceituação de bens e serviços comuns, serve mesmo para confundir o intérprete, levando a crer ser possível licitar, por outros meios, outras modalidades, bens e serviços sem defini-los objetivamente no edital.

Isso, obviamente, nunca foi admissível, pois já no artigo 40 da Lei 8.666/93 estabelecia-se que o objeto da licitação deveria ser definido de forma clara e sucinta, o que pressupõe objetividade.

Pode-se assim afirmar que, em todas as licitações, o objeto deverá ser definido de forma objetiva, permitindo aos licitantes saber com precisão o que é pretendido pela administração, devendo a definição constar do edital.

Tentemos, então, aprofundar a definição do que sejam bens e serviços comuns.

Comum”, a nosso ver, está na lei para caracterizar bens e serviços conhecidos de forma inquestionável e obtidos com facilidade pelo mercado, que sigam padrões usuais de especificação ou execução. São bens e serviços, também, que já estão enraizados no hábito da administração, fazendo parte do dia a dia dos órgãos públicos, podendo se dizer que assim se caracteriza a maioria dos objetos classificados como material de consumo.

A padronização desses objetos aqui mencionada, não necessita ter sido reconhecida em procedimento administrativo, e menos ainda seguir regras legais ou conceituais com fundamentos técnicos (por exemplo, ABNT), podendo decorrer de aspectos práticos, de uma reiterada verificação no mercado.

Anote-se, ainda, que “comum” não é sinônimo necessário de “simples”, como pode à primeira vista parecer. “Simples” é antagônico de “complexo”, e não se pode dizer que um bem ou serviço complexo não possa ser comum. Isso será possível quando a referida complexidade for facilmente encontrável no mercado, for usual e difundida de tal forma que tecnicamente seja de domínio amplo.

Assim, pode-se dizer até mesmo que a construção da noção de bem ou serviço comum está implicitamente relacionada à singeleza, à celeridade do procedimento licitatório do pregão, ao menos na versão estabelecida pela Lei 10.520/02, de modo a admitirem-se apenas os objetos que podem ser definidos tendo em vista esse fato.

A singeleza do procedimento do pregão se caracteriza, dentre outras coisas, pelo curto tempo para oferecimento de propostas — mínimo de oito dias úteis —, o que seria incongruente se admitido para a busca de objetos não previamente disponíveis no mercado, amplamente difundidos tecnologicamente; outrossim, encontra-se amparada no fato de que o julgamento se dará destacadamente pelo menor preço (artigo 6º, XLI), não se admitindo a melhor técnica ou a técnica e preço, mas apenas a indicação de parâmetros de desempenho e qualidade, o que qualifica a objetividade buscada no certame.

Assim, concordamos com Marçal Justen Filho quando assevera:

Em última análise, bem ou serviço “comum”, para fins da adoção de pregão, é aquele que pode ser adquirido no mercado sem maior dificuldade, nem demanda maior investigação acerca do fornecedor.

Ou seja, a interpretação do conceito de “bem ou serviço comum” deve fazer-se em função das exigências do interesse público e das peculiaridades procedimentais do próprio pregão. A natureza do pregão deve ser considerada para determinar o próprio conceito de “bem ou serviço comum”.

Pode dizer-se que “comum” não é o objeto destituído de sofisticação, mas aqueles para cuja aquisição satisfatória não se fazem necessárias investigações ou cláusulas mais profundas.

Enfim, são comuns os objetos padronizados, aqueles que têm um perfil qualitativo definido e conhecido ao mercado.[1]

Ante essas anotações, ousamos dizer que certamente os idealizadores do pregão, ao fixar a modalidade, primeiro vislumbraram um procedimento licitatório célere, e depois partiram para verificar quais objetos poderiam ser adquiridos e contratados em face da singeleza do que fora criado. Partiram da necessidade de implementar rapidez às compras corriqueiras e aos serviços usuais, e criaram um procedimento “enxuto”, desprovido de amarras e filigranas, mas somente depois de constituí-lo é que definiram quais objetos eram adequados ao seu uso. E pecaram ao fazê-lo, pois na verdade a definição do parágrafo único do artigo 1º da Lei 10.520/02 – agora incorporada na Lei 14.133/21 – em nada acrescenta quanto a auxiliar na delimitação dos objetos que podem ser submetidos ao pregão.

Assim, a busca dessa definição, destinada a saber quais os objetos são bens e serviços comuns, a nosso ver, deve partir da motivação existente na criação da modalidade e da estrutura legal criada para seu procedimento, como anteriormente anotamos.

Desse modo, em todos os casos em que estejamos diante da pretensão de se adquirir (comprar) ou se contratar serviços caracterizados como comuns, nos termos antes anotados, poder-se-á adotar a licitação na modalidade pregão.

Bens e Serviços Especiais

A definição dessa categoria de bens e serviços, na lei, dá-se por exclusão:

Art.6º …

XIV – bens e serviços especiais: aqueles que, por sua alta heterogeneidade ou complexidade, não podem ser descritos na forma do inciso XIII do caput deste artigo, exigida justificativa prévia do contratante;

Esses serviços e bens são os que não se enquadram como comuns, na acepção do termo legal, e por sua vez não podem ser licitados pelo pregão, devendo submeter-se à modalidade de concorrência, nos termos de sua definição no artigo 6º, XXXVIII.

Enquadram-se nessa categoria, os serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual (definidos no inciso XVIII do artigo 6º).

Serviço e Fornecimento Contínuo

Em boa hora a lei trouxe essa definição, que vinha sendo reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência em face das situações práticas vivenciadas pela administração.

Pela Lei 8666/93 dispúnhamos apenas da menção aos serviços contínuos, no artigo 57, II, para fins de estabelecer prazos contratuais. Nada se falava de sua definição, e muito menos a respeito dos fornecimentos contínuos (quanto a esses, sequer existia norma a respeito do prazo contratual. Com o tempo, contudo, passaram a receber mesmo tratamento dos serviços contínuos pela doutrina e pela jurisprudência).

Os serviços categorizados como tais eram aqueles dos quais a administração necessitava de forma contínua, permanente. Interessava, pela definição, a sua necessidade, e nada tinha a ver com a eventual essencialidade do serviço. Caracterizam-se, como tal, por exemplo, serviços de limpeza predial, de cessão de softwares dentre outros.

Os fornecimentos (compra de bens) contínuos, em que pese ausência de norma nesse sentido – o artigo 57, II da Lei 8666/93 falava em serviços – passaram a ser tratados da mesma forma[2].

Com a edição da Lei 14.133/21, seu artigo 6º, XV, traz a seguinte definição:

Art.6º…

XV – serviços e fornecimentos contínuos: serviços contratados e compras realizadas pela Administração Pública para a manutenção da atividade administrativa, decorrentes de necessidades permanentes ou prolongadas;

A rigor, a lei emprega as expressões contínuos, permanentes e prolongadas.

Contínuos é tratado como gênero, que se divide nas categorias permanentes e prolongadas. A bem da verdade, contínuos são os serviços ou fornecimentos, ao passo que permanentes ou prolongadas, são as necessidades a serem satisfeitas.

A primeira categoria, permanentes, quer dizer duradoura, estável, frequente, a indicar as necessidades constantes da administração quanto a serviços ou fornecimentos. Parece-nos sinônima de contínuos, na expressão empregada pela Lei 8666/93 a que aludimos anteriormente.

A segunda categoria, prolongadas, quer dizer alongada, esticada, e é usada pela lei para dar igual tratamento às situações que ainda que não se caracterizem como permanentes, estendam-se por determinado e razoável prazo.

Assim, em um Município, como ademais em qualquer órgão administrativo, teremos serviços permanentes, a exemplo dos serviços de limpeza predial, de portaria e zeladoria, posto que sempre serão demandados; da mesma forma, teremos serviços de necessidade prolongada, que serão exigidos por um tempo razoável, e depois poderão não ser mais solicitados. Como exemplo considere-se os serviços de manutenção predial.

Contratos com objetos de serviços e fornecimentos contínuos poderão ser firmados pelo prazo de até 05 (cinco) anos, admitida a prorrogação até o prazo máximo de 10 (dez) anos:

Art. 106. A Administração poderá celebrar contratos com prazo de até 5 (cinco) anos nas hipóteses de serviços e fornecimentos contínuos, observadas as seguintes diretrizes:

I – a autoridade competente do órgão ou entidade contratante deverá atestar a maior vantagem econômica vislumbrada em razão da contratação plurianual;

II – a Administração deverá atestar, no início da contratação e de cada exercício, a existência de créditos orçamentários vinculados à contratação e a vantagem em sua manutenção;

III – a Administração terá a opção de extinguir o contrato, sem ônus, quando não dispuser de créditos orçamentários para sua continuidade ou quando entender que o contrato não mais lhe oferece vantagem.

  • 1º A extinção mencionada no inciso III do caput deste artigo ocorrerá apenas na próxima data de aniversário do contrato e não poderá ocorrer em prazo inferior a 2 (dois) meses, contado da referida data.
  • 2º Aplica-se o disposto neste artigo ao aluguel de equipamentos e à utilização de programas de informática.

Art. 107. Os contratos de serviços e fornecimentos contínuos poderão ser prorrogados sucessivamente, respeitada a vigência máxima decenal, desde que haja previsão em edital e que a autoridade competente ateste que as condições e os preços permanecem vantajosos para a Administração, permitida a negociação com o contratado ou a extinção contratual sem ônus para qualquer das partes.

Serviços Contínuos com Regime de Dedicação Exclusiva de Mão de Obra

Recorrentemente a administração necessita de serviços em que se emprega mão de obra e se exige que as pessoas vinculadas à atividade tenham dedicação exclusiva ao contrato. A Lei 14.133/21 em seu artigo 6º, XVI tratou de definir essa categoria de serviços como segue:

Art.6º …

XVI – serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra: aqueles cujo modelo de execução contratual exige, entre outros requisitos, que:

a) os empregados do contratado fiquem à disposição nas dependências do contratante para a prestação dos serviços;

b) o contratado não compartilhe os recursos humanos e materiais disponíveis de uma contratação para execução simultânea de outros contratos;

c) o contratado possibilite a fiscalização pelo contratante quanto à distribuição, controle e supervisão dos recursos humanos alocados aos seus contratos;

É evidente na definição a preocupação apresentada pela lei com essa categoria, especialmente para estabelecer seus contornos, exigindo textualmente que os empregados do contratado fiquem à disposição nas dependências do contratante para a prestação dos serviços. Essa condição deve surgir em função da necessidade da administração e aciona de forma evidente a preocupação de que não se confunda com a mera cessão de mão de obra, rechaçada em face da agressão à Constituição Federal. Os empregados da contratada ficam nas dependências da administração, mas a ela não se subordinam, seguindo sob o comando da empresa prestadora dos serviços.

Da mesma forma, e para permitir a exata verificação das atividades desenvolvidas pela contratada, é impedido que esta compartilhe os recursos humanos e materiais disponíveis de uma contratação para execução simultânea de outros contratos. Referida vedação, garante a medição dos serviços e a certeza de que os meios empregados na relação contratual vinculam-se tão somente àquele contrato. Auxilia também a reforçar a ideia de que estamos diante de contrato de prestação de serviços, e não de cessão de mão de obra, posto que na execução está previsto expressamente o emprego de materiais, além de pessoas.

Por fim, garante-se ao poder público que o contratado possibilite a fiscalização pelo contratante quanto à distribuição, controle e supervisão dos recursos humanos alocados aos seus contratos. Esse tipo de controle, a rigor, sequer precisaria estar expresso dessa forma, sendo decorrência natural da relação firmada. Contudo, parece-nos salutar a previsão, além de reforçar à exaustão que a administração não gerencia a execução contratual, afeta ao contratado, mas apenas fiscaliza se essa execução está sendo realizada nos moldes avençados.

Exigências dos Contratados nos Serviços Contínuos com Regime de Dedicação Exclusiva de Mão de Obra

Conhecedor da dificuldade de controle dos serviços prestados dessa forma (com dedicação exclusiva de mão de obra), e sabedor dos problemas que surgem em desfavor da administração, especialmente depois de concluídos, ou no caso da contratada enfrentar percalços de ordem financeira, a Lei estabeleceu a obrigatoriedade da contratada apresentar documentos referentes a seus empregados, quando solicitado, sob pena de multa. Diz o artigo 50:

Art. 50. Nas contratações de serviços com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, o contratado deverá apresentar, quando solicitado pela Administração, sob pena de multa, comprovação do cumprimento das obrigações trabalhistas e com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) em relação aos empregados diretamente envolvidos na execução do contrato, em especial quanto ao:

I – registro de ponto;

II – recibo de pagamento de salários, adicionais, horas extras, repouso semanal remunerado e décimo terceiro salário;

III – comprovante de depósito do FGTS;

IV – recibo de concessão e pagamento de férias e do respectivo adicional;

V – recibo de quitação de obrigações trabalhistas e previdenciárias dos empregados dispensados até a data da extinção do contrato;

VI – recibo de pagamento de vale-transporte e vale-alimentação, na forma prevista em norma coletiva.

Os documentos indicados são os básicos da relação de emprego, afetos aos empregados da contratada, e não impede que o edital e o contrato estabeleçam outros que a seu sentir garantam mais segurança e certeza na execução adequada do ajustado. Da mesma forma, o edital e depois o contrato devem estabelecer a multa a ser cobrada pelo não cumprimento da obrigação.

Em objetos desta natureza, oportuno destacar o debate quanto à responsabilidade subsidiária e solidária da administração pelos encargos trabalhistas decorrentes da contratação de serviços terceirizados.

Nos termos da Sumula 331 do TST, (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011:  “Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.” (g.n)

Ainda, Jurisprudencialmente, quanto a responsabilização da administração pública, destacamos:

EMENTA: EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TEMA 246 DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EMPRESAS TERCEIRIZADAS. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU ERRO MATERIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. Não há contradição a ser sanada, pois a tese aprovada, no contexto da sistemática da repercussão geral, reflete a posição da maioria da Corte quanto ao tema em questão, contemplando exatamente os debates que conduziram ao acórdão embargado. 2. Não se caracteriza obscuridade, pois, conforme está cristalino no acórdão e na respectiva tese de repercussão geral, a responsabilização subsidiária do poder público não é automática, dependendo de comprovação de culpa in eligendo ou culpa in vigilando, o que decorre da inarredável obrigação da administração pública de fiscalizar os contratos administrativos firmados sob os efeitos da estrita legalidade. 3. Embargos de declaração rejeitados.”(RE 760931 ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 01/08/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-194  DIVULG 05-09-2019  PUBLIC 06-09-2019) (g.n)

Veda-se a responsabilização automática da administração, só cabendo a sua condenação se houver prova inequívoca de sua conduta omissiva ou comissiva na fiscalização dos contratos. A responsabilidade subsidiária é apurada na medida da fiscalização exercida dentro do contrato, colocando a atividade de fiscalização em patamar importantíssimo a fim de evitar tais responsabilizações. Assim, é de primordial importância a previsão dos procedimentos de fiscalização das obrigações trabalhistas e previdenciárias do contratado.

Objetos Passíveis de Terceirização

Discussão recorrente no poder público é a de saber se podem ser contratados serviços de terceiros e para quais as atividades isso é possível.

Sempre defendemos que esse tipo de contratação é plenamente admissível, em que pese reconhecermos pontos de dificuldade para superação dos entendimentos contrários, os quais devem-se, no mais das vezes, a uma distorção implementada ao sistema de terceirização.

Com efeito, a terceirização é um modelo de gestão e como tal fica adstrita ao campo de conveniência e discricionariedade do administrador. Somente a ele, e de forma fundamentada, é dado escolher os caminhos para esses contratos.

Por esse modelo, frise-se, contrata-se serviços de terceiros, não podendo se confundir com a contratação para mera cessão de mão de obra.

O ponto de discórdia da questão reside nesse aspecto. Ora se avança o limite da contratação de serviços, adentrando na mera cessão de pessoas; ora se interpreta apressadamente os objetos contratuais sem aprofundamento e análise de sua essência (isso acontece muitas vezes quando o objeto do contrato figura em um campo próximo da atividade-fim do órgão. Quando isso ocorre, de inopino deixa-se de investigar a real atividade, fechando-se os olhos para aspectos que demonstrem que na realidade trata-se de atuação complementar).

Nos casos em que se avance o limite, em que ocorra mera cessão de mão de obra, teremos de fato situações que agredirão a Constituição Federal, posto que teremos “contratados” atuando ao lado de servidores públicos, desenvolvendo atividades próprias deste, a exigir prévia seleção por concurso público, ou contratação temporária por excepcional interesse público (artigo 37, II e IX da Constituição Federal) e, da mesma forma, estaremos diante de situação em que as despesas referentes aos pagamentos a essas pessoas, nos termos do artigo 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal, deverão realmente ser consideradas como se fossem de servidor público, em substituição.

Essa, no entanto, é a exceção, sendo regra a contratação de serviços terceirizados nos termos admitidos tanto pela legislação, quanto pela jurisprudência.

A Lei 14.133/21, acerta ao elencar as situações em que se admite a contratação, estabelecendo, no artigo 48, que:

Art. 48. Poderão ser objeto de execução por terceiros as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituam área de competência legal do órgão ou da entidade, vedado à Administração ou a seus agentes, na contratação do serviço terceirizado:

I – indicar pessoas expressamente nominadas para executar direta ou indiretamente o objeto contratado;

II – fixar salário inferior ao definido em lei ou em ato normativo a ser pago pelo contratado;

III – estabelecer vínculo de subordinação com funcionário de empresa prestadora de serviço terceirizado;

IV – definir forma de pagamento mediante exclusivo reembolso dos salários pagos;

V – demandar a funcionário de empresa prestadora de serviço terceirizado a execução de tarefas fora do escopo do objeto da contratação;

VI – prever em edital exigências que constituam intervenção indevida da Administração na gestão interna do contratado.

Parágrafo único. Durante a vigência do contrato, é vedado ao contratado contratar cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de dirigente do órgão ou entidade contratante ou de agente público que desempenhe função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do contrato, devendo essa proibição constar expressamente do edital de licitação.

De forma adequada, a Lei definiu que as atividades materiais acessórias, instrumentais, nominadas atividades-meio desempenhadas pelos órgãos, podem ser terceirizadas. São as atividades que não estão intimamente vinculadas à missão institucional do órgão.

Assim, uma prefeitura, por exemplo, presta serviços públicos de competência Municipal à coletividade, e não se insere nessa atividade fim a limpeza dos prédios em que suas repartições estão sediadas, e muito menos os serviços de zeladoria e portaria dos mesmos. São, portanto, serviços que obviamente caracterizam-se como acessórios, instrumentais, podendo ser contratados com terceiros.

A Lei avançou também par autorizar a contratação de serviços complementares. Esses serviços não são mais os de apoio, os acessórios, os instrumentais…. Passam a ao menos resvalar na atividade-fim do órgão, aproximam-se do motivo de sua existência, mas continuam circundando a essencialidade, ficando apenas na órbita da complementariedade.

Um exemplo melhora o entendimento. Os serviços de diagnósticos por imagem (RX, ultrassom, ressonância magnética…) são cada vez mais requisitados por médicos, inclusive no serviço público. O Município, por seu setor de saúde, tem como atividade essencial prestar serviços da espécie à coletividade (é um direito constitucional – artigo 196: a saúde é direito de todos e dever do Estado…). Não há dúvida, contudo, de que possa terceirizar a realização desses serviços de imagem, que são de saúde, vinculados à atividade-fim, no entanto meramente complementares.

A discussão, nesse momento, passa a residir na definição do que seja complementariedade à atividade-fim. Em linhas gerais, complementar é o que agrega, soma-se ao que é básico. No caso do poder público, os serviços complementares serão aqueles que serão disponibilizados em somatória ao que ele presta diretamente, agregando outras possibilidades de realização, a favor da coletividade.

Com isso, a noção de complementariedade nunca retirará do poder público o controle e gestão dos serviços que presta, inexistindo comprometimento de que haja substituição do público pelo privado.

Na área da saúde, pela complexidade da prestação dos serviços, isso é muito comum, e a rigor admitido pelo artigo 199 da Constituição Federal.

Em seguida, o mesmo artigo 48, em seus incisos, buscando preservar a regulamentar distância entre contratado e poder público, e partindo dos problemas recorrentes já enfrentados pela administração, estabeleceu vedações expressas à ação do agente público.

Proíbe  indicar pessoas expressamente nominadas para executar direta ou indiretamente o objeto contratado; fixar salário inferior ao definido em lei ou em ato normativo a ser pago pelo contratado; estabelecer vínculo de subordinação com funcionário de empresa prestadora de serviço terceirizado; definir forma de pagamento mediante exclusivo reembolso dos salários pagos; demandar a funcionário de empresa prestadora de serviço terceirizado a execução de tarefas fora do escopo do objeto da contratação; prever em edital exigências que constituam intervenção indevida da Administração na gestão interna do contratado.

Em suma, veda-se as principais atividades que geram uma verdadeira simbiose entre a contratada e o poder público, e que permitem inclusive a caracterização de vínculo empregatício entre o empregado da contratada e a administração.[3] Essas normas vêm bem a calhar, e servem, se implementadas na prática, também para provar que a execução contratual distancia-se da mera cessão de mão de obra.

Serviços não Contínuos ou Contratados por Escopo

Definido pelo artigo 6º, XVII temos a categoria de serviços denominados de não contínuos ou de escopo.

Art.6º…

XVII – serviços não contínuos ou contratados por escopo: aqueles que impõem ao contratado o dever de realizar a prestação de um serviço específico em período predeterminado, podendo ser prorrogado, desde que justificadamente, pelo prazo necessário à conclusão do objeto;

Escopo quer dizer finalidade, objetivo, alvo. Assim, os contratos dessa categoria são aqueles ajustados por um período determinado, suficiente para que o contratado possa atingir o fim a que se propôs, atingir e alcançar o escopo. Com isso a nova lei estabeleceu que o prazo para esse tipo de ajuste será aquele que vier a ser fixado no contrato e que sua vigência será automaticamente prorrogada quando seu objeto não for concluído no período firmado no contrato (artigo 111).

Isso soluciona diversas situações que até o momento tangenciavam a norma da Lei 8666/93. Nesse diploma, como bem lembram os iniciados na matéria, não se permitia contrato com prazo indeterminado (artigo 57, parágrafo 3º), e não havia regra para vigência de contrato de escopo. Assim, ficava o impasse. Na obrigação de estabelecer um prazo, sendo serviço estabelecia-se a vigência por 12 (doze) meses, e prorrogava-se até o limite de 60 (sessenta) meses. Contudo, caso o escopo não tivesse sido atingido pairava a dúvida, seguindo com a prorrogação contratual sem muita segurança e sem respaldo em norma legal.

Serviços Técnicos Especializados de Natureza Predominantemente Intelectual

Na mesma medida em que a Lei 8666/93 definia serviços técnicos profissionais especializados (artigo 13) a Lei 14.133/21 define serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual, e o faz no artigo 6º, XVIII:

Art.6º…

XVIII – serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual: aqueles realizados em trabalhos relativos a:

a) estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos e projetos executivos;

b) pareceres, perícias e avaliações em geral;

c) assessorias e consultorias técnicas e auditorias financeiras e tributárias;

d) fiscalização, supervisão e gerenciamento de obras e serviços;

e) patrocínio ou defesa de causas judiciais e administrativas;

f) treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;

g) restauração de obras de arte e de bens de valor histórico;

h) controles de qualidade e tecnológico, análises, testes e ensaios de campo e laboratoriais, instrumentação e monitoramento de parâmetros específicos de obras e do meio ambiente e demais serviços de engenharia que se enquadrem na definição deste inciso;

À época da Lei 8666/93, o que parece se estenderá para esse novo diploma, prevaleceu o entendimento de que o rol de serviços descritos nessa categoria era meramente exemplificativo.

Os serviços aqui descritos são a uma só vez, técnicos, especializados e de natureza predominantemente intelectual, de modo a indicar a habilitação destacada, não se admitindo para sua contratação e prestação que sejam executados por pessoas com pequena ou nenhuma experiência.

A sua contratação dar-se-á mediante realização de licitação, julgada pelo critério de técnica e preço (artigo 36, parágrafo 1º, I).

O procedimento licitatório será inexigível nos termos do artigo 74, III, quando contratado com profissionais de notória especialização, os assim definidos no parágrafo 3º do próprio artigo 74.

Contratação de mais de um Prestador

Expressamente a nova lei de licitações e contratos administrativos admite a possibilidade de se promover a contratação de mais de um particular para executar o mesmo serviço.  E estabelece os requisitos no artigo 49:

Art. 49. A Administração poderá, mediante justificativa expressa, contratar mais de uma empresa ou instituição para executar o mesmo serviço, desde que essa contratação não implique perda de economia de escala, quando:

I – o objeto da contratação puder ser executado de forma concorrente e simultânea por mais de um contratado; e

II – a múltipla execução for conveniente para atender à Administração.

Parágrafo único. Na hipótese prevista no caput deste artigo, a Administração deverá manter o controle individualizado da execução do objeto contratual relativamente a cada um dos contratados.

O mais importante, no entanto, a regra esqueceu-se de anotar e definir: a questão dos valores, parecendo-nos óbvio que não se possa pagar valores diferentes por serviços iguais, o que feriria o procedimento competitivo, a igualdade e a economicidade.

Assim, quando se definir, justificadamente, por contratar mais de um particular para execução de serviço idêntico em condições idênticas, será necessário estabelecer mecanismo para unificação dos preços (quando tratamos do registro de preços, vez que nesse procedimento auxiliar admite-se a contratação de mais de um preço registrado).

Padronização e Parcelamento de Serviços

Tal como no caso das compras, também quanto aos serviços a Lei 14.133/21 estabelece como princípios específicos para as licitações desse objeto o respeito à padronização, e ao parcelamento.

Art. 47. As licitações de serviços atenderão aos princípios:

I – da padronização, considerada a compatibilidade de especificações estéticas, técnicas ou de desempenho;

II – do parcelamento, quando for tecnicamente viável e economicamente vantajoso.

  • 1º Na aplicação do princípio do parcelamento deverão ser considerados:

I – a responsabilidade técnica;

II – o custo para a Administração de vários contratos frente às vantagens da redução de custos, com divisão do objeto em itens;

III – o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado.

  • 2º Na licitação de serviços de manutenção e assistência técnica, o edital deverá definir o local de realização dos serviços, admitida a exigência de deslocamento de técnico ao local da repartição ou a exigência de que o contratado tenha unidade de prestação de serviços em distância compatível com as necessidades da Administração.

A respeito da padronização, os comentários então apresentados para compras cabem também aos serviços.

A respeito do parcelamento, é oportuno acrescentar as premissas estabelecidas no parágrafo 1º, I e II do artigo 47.

No tocante aos serviços será fundamental para a sua aplicação verificar aspectos quanto a responsabilidade técnica posto que na execução parcelada essa situação poderá fugir do controle, de modo a reforçar a atenção para a sua preservação, sem prejuízo à administração. Há que se pensar se a existência de muitos contratados não levará à perda da definição da responsabilidade técnica pelo objeto (s).

Da mesma forma deverá refletir quanto ao custo para a Administração de vários contratos frente às vantagens da redução de custos, com divisão do objeto em itens. Precisará, nesse sentido, saber o que é mais adequado e vantajoso: administrar apenas um contrato, ainda que seus valores sejam mais altos; ou administrar diversos ajustes, com os ônus decorrentes da gestão de diversas avenças, com a obtenção de valores mais baixos.

[1] Pregão: (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico), p. 20.

[2] “Primeiramente, vale trazer à baila a questão tratada no TC-000178/026/06, sob minha relatoria, relacionada à prorrogação de contratos desta natureza, que por interpretação extensiva ao art. 57, inc. II, da Lei de Licitações, pode ser considerada legalmente cabível. Explico.

Há determinadas situações em que poderá ser reconhecido um contexto de fornecimento contínuo no qual haverá uma interpretação extensiva do artigo 57, inciso II, da Lei de Licitações, para o fim de ser admitida a prorrogação de prazo prevista naquele dispositivo legal.

De fato, tal como ocorre com a prestação de serviços de caráter continuado, existem situações em que há contratos de fornecimento que, do mesmo modo, possuem o caráter de continuidade e de previsibilidade, vez que há um rol de produtos cujo fornecimento se repete no tempo, ao longo de um determinado período de vigência pactuado, sendo que a continuidade desse fornecimento revela-se como requisito essencial para a manutenção de determinados serviços públicos.

Já no tocante à questão orçamentária tratada pelo “caput” do artigo 57, da Lei de Licitações, não há óbice, pois, em se tratando de fornecimento de produtos caracterizado pela continuidade e pela previsibilidade, os recursos necessários já estarão reservados em dotação orçamentária específica, previamente estabelecida na Lei Orçamentária Anual, os quais serão utilizados, do mesmo modo, tanto em uma contratação nova, quanto em uma eventual prorrogação de prazo, já que não poderá haver uma interrupção desse fornecimento.” TC-010886/026/07 – Cons. Rel. Dr. Eduardo Bittencourt Carvalho – DOE 27.08.2011 – TCE/SP

[3] É imprescindível a presença do preposto do contratado no local da obra ou serviço, para representá-lo na execução do objeto e organizar e dirigir o trabalho de seus funcionários. Assim, os funcionários receberão ordens apenas do preposto, evitando-se a subordinação destes funcionários aos servidores da contratante.

A subordinação, a pessoalidade, a habitualidade e a remuneração são características do vínculo empregatício (art. 3º do Decreto-Lei nº 5.452/43), e devem ser evitadas para que a Administração não venha a figurar no polo passivo de ações trabalhistas concernentes ao inadimplemento de encargos trabalhistas e previdenciários aos funcionários do contratado.

Deve-se, portanto, evitar cláusulas como as que preveem que o contratado fica obrigado a substituir, a pedido e interesse da contratante, os funcionários que prestam o serviço ou atuam na obra, ou a contratar determinadas pessoas por indicação da contratante. Isto porque a rejeição de funcionário da Contratada pela Administração pode caracterizar a pessoalidade.” Manual Licitações e Contratos: Principais aspectos da fase preparatória e gestão contratual”, 2019   – p. 93 – TCE/SP

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