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Artigo: Nova Lei de Licitações – Os Critérios de Julgamento - O Menor Preço por Marcelo Palavéri.

 

* Marcelo Palavéri    

          Ao promover a leitura da Lei 14.133/21, poderá se verificar que a regra de sua estrutura conduz à afirmativa de ter o legislador adotado, como critério preferencial, para o julgamento de licitação, o menor preço. Assim, pode se afirmar, que esse critério é a regra, sendo a exceção julgar-se o certame pelos outros admitidos.

            O critério básico de licitação, o menor preço, significa que se julgará vencedora a proposta do licitante que ofertou o menor custo financeiro para o poder público, desde que, é obvio, apresente proposta de acordo com as especificações do edital. Daí a redação do artigo 34:

Art. 34. O julgamento por menor preço ou maior desconto e, quando couber, por técnica e preço considerará o menor dispêndio para a Administração, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação.

         Extrai-se desse preceito ser errôneo afirmar-se que a administração deve comprar sempre o que for mais barato, via de regra pecando, em suas compras, ao não alcançar a qualidade dos produtos e serviços pretendidos.

            O vencedor será sempre aquele que ofertar o menor preço, nomeadamente definido como menor dispêndio, o que não impede a administração de buscar produtos, serviços e obras de qualidade, alcançada com a adoção de cautelas na confecção do ato convocatório.

            O fato de estar vinculada a julgar o certame pelo menor preço não impede que se busque a qualidade, a durabilidade dos bens, etc. Isso apenas redobra a importância de bem definir o objeto pretendido, descrevendo-o com minúcias e detalhes, permitindo a eliminação de produtos e bens inaptos a atender às pretensões do poder público.

            Com isso, a administração deve se esmerar na descrição do objeto e dos termos do edital e seus anexos, reforçando-se o que aqui já se afirmou no sentido de ser necessária a integração entre o setor administrativo que processa o certame e aquele solicitante do bem, serviço ou obra, o qual utilizará, ao final, o objeto a ser contratado. No mais das vezes, esses setores é que conhecem melhor o objeto pretendido, redobrando-se a sua responsabilidade pela qualidade da futura aquisição, devendo auxiliar na descrição do objeto e no estabelecimento de especificações sobre o mesmo.

            Essa discussão a respeito da busca da qualidade dos bens ainda que nas licitações julgadas pelo menor preço, induz por exemplo à discussão a respeito da possibilidade de se exigir a apresentação de amostras, podendo submetê-las a testes ou ensaios. É plenamente possível tal exigência, sob pena de não se conseguir verificar com precisão a qualidade dos produtos oferecidos, sendo rechaçados apenas em fase prévia à da apresentação das propostas, devendo ser analisados na fase de julgamento e não na fase de habilitação.

            No tocante ao julgamento pelo menor preço, impõe ainda discutir duas outras questões que via de regra suscitam polêmica.

            A primeira, a de saber sobre a possibilidade de os licitantes apresentarem preços iguais ou próximos de zero, ou até mesmo negativo. Em regra, esse procedimento era rechaçado, sendo expressamente vedado pelo parágrafo 3º do artigo 44 da Lei 8.666/93. Contudo, há situações em que com o tempo passou a ser admitido, como por exemplo, no caso de compra de vales/cartões refeições/alimentações, onde é usual as administradoras desses cartões trabalharem com taxa de administração próxima de zero, ou até mesmo negativa, vindo a administração a pagar menor valor que o constante da face do “cupom”.[1]

         Nesse aspecto a nova lei perdeu oportunidade de conferir maior segurança aos procedimentos, admitindo expressamente a hipótese, que a nosso ver seguirá válida, posto que ao final reflete o critério de julgamento do menor preço, em seu sentido mais amplo, o da busca do menor dispêndio para o erário.

          A segunda questão, impõe-nos comentar, diz respeito à exigibilidade de se apresentarem os preços unitários, e até mesmo desclassificar propostas que não contenham tais valores, ainda que de menor preço, quando diante de julgamento pelo preço global.

            Pensamos que, se o edital exige a apresentação de preços unitários, esses devem ser ofertados, ainda que o certame seja julgado pelo preço global, e na ausência de sua indicação deve o licitante ser desclassificado. Esse posicionamento vem corroborado pelas decisões judiciais[2].

 

[1] “A oferta de taxa negativa é prática corrente no mercado de gerenciamento de cartões alimentação, que tem se revelado exequível e sem risco de ofensa ao princípio da economicidade, sendo aceita pela jurisprudência dominante desta E. Corte de Contas, a exemplo do decidido nos autos do processo TC-11443.989.17-3”  TCE/SP –  TC-001140.989.18-7 – Cons. Rel. Dr. Dimas Eduardo Ramalho – DOE 25.01.2018

[2] Veja que o Superior Tribunal de Justiça já asseverou: “Ainda que controvertida no Superior Tribunal a tese de que, quando não impugnadas as regras do edital de licitação, haveria decadência somente em relação à administração, mas podendo o Judiciário apreciá-las, na espécie, a Turma não vislumbrou qualquer ilegalidade ou incompatibilidade em edital de licitação na modalidade de menor preço, que exige, também, valores unitários, em itens preestabelecidos, em sintonia com o valor global (arts. 40, 44,45 e 48 da Lei n. 8.666/1993). Precedentes citados: RMS 10.847-MA – DJ de 18.1.2002 e RMS 11.782 – MG, DJ de 18.3.2002.” (RMS 15.051-RS – Rel. Min. Eliana Calmon, j. em 1º.10.2002). Oportuno e esclarecedor o julgamento do Tribunal de Justiça de São Paulo: “2) A r. sentença guerreada deu adequada solução ao mandado de segurança.

Com efeito, a própria autoridade coatora informou que a empresa, vencedora do certame licitatório, omitiu “um dos itens da planilha de preços unitários que integrava a proposta” (fl. 80), tendo sido corrigida tal irregularidade, posteriormente.

Como bem consignado na r. sentença monocrática, “trata-se do valor de um dos itens do edital…”, e, não, de um vício sanável, “puramente burocrático”(fl. 160).

Na verdade, tal empresa licitante “deixou de consignar na planilha orçamentária de sua proposta comercial a descrição unitária e o preço de azulejos”, na aguda observação do douto Procurador de Justiça oficiante (fl. 174).

Afigura-se, dessarte, gritante a falha.

E, da forma como agiu a Comissão Permanente de Licitações, deu-se tratamento desigual à empresa vencedora, permitindo que fosse preenchida uma exigência após abertura das propostas.

3) Consigne que o edital de convocação, expressamente estabelece que a falta de atendimento de “qualquer das exigências” implica em desclassificação (item VII, “E.I”).

Sendo assim, a Comissão não estava autorizada a corrigir ex offício a proposta da aludida
empresa, em face da vinculação à lei do edital.

É sabido que a Lei n. 8.666/1993 consagra o princípio da vinculação ao instrumento convocatório (art. 3º), explicitando que “a administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculado”(art. 41, caput).

A doutrina também, não destoa desta diretriz, considerando que o edital “é a lei da licitação e do contrato, pois o que nele contiver deve ser rigorosamente cumprido, sob pena de nulidade; trata-se de aplicação do princípio da vinculação ao instrumento convocatório…”(Maria Sylvia Zanella di Pietro, Direito Administrativo, Atlas, 1994, 4ª edição, pág 283).

O critério do “preço menor” não tem o condão de justificar a classificação da empresa, em comento.

Incensurável, pois, a anulação do certame, que culminou com a classificação de empresa que inobservou o edital convocatório.” (Ap. Cível 116.628-5/5-00 – Rel. Des. William Marinho).

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